01 fevereiro 2007

Niemeyer 4


Um ‘vetor’ apontado para os EUA
Niemeyer revela maquete de monumento encomendado por Chávez


Da gestação de seus ideais revolucionários (livrar toda a América do jugo espanhol) à realização efetiva do seu projeto histórico, Simón Bolívar precisou de mais de uma década. Para projetar um monumento em sua homenagem (a pedido do presidente venezuelano, Hugo Chávez), Oscar Niemeyer precisou de apenas um fim de semana.

— Ele me pediu informalmente quando veio me visitar aqui em casa. Eu estava sem nada para fazer, então rabisquei um pouco no papel e quando vi o monumento estava ali, pronto — explica o arquiteto, entusiasta do líder venezuelano, fazendo pouco da maquete de papelão sobre mesa de trabalho na sala de seu apartamento em Ipanema, onde recupera-se à base de fisioterapia de um tombo que levou meses atrás.

Difícil, porém, desdenhar, ainda que em esforço de fairplay, da estrutura de 100 metros em balanço livre a ser erguida em Caracas e destinada a bater o recorde mundial do concreto armado.

— Olha, está apontado para os Estados Unidos — arrisca Niemeyer, parecendo experimentar um prazer supremo em imaginar as conseqüências, ainda que simbólicas, de se apontarem objetos para Washington.

Ele nega, contudo, tratar-se de um lançador de mísseis, preferindo apenas metaforizar a postura de confronto assumida por Chávez em relação aos primos do norte e ao presidente Bush.

— Não, uma arma não. É um movimento. Um vetor. A arquitetura tem sempre que surpreender, criar curiosidade, senão não adianta. Ainda mais quando se trata de exprimir a coisa toda do Chávez, que é revolucionária, de mudança de ventos, audaciosa, corajosa.

O projeto, que prevê, ao pé da estrutura cercada por um espelho d’água, um museu dedicado a Bolívar, já foi enviado para o presidente venezuelano no fim de semana passado.

Agora, resta a el comandante dar a palavra final e a ordem de execução. Da obra, esclareça-se...

Matéria de Arnaldo Bloch e Chico Otávio publicada no jornal O Globo em 31 de janeiro de 2007


‘Formas e dimensões puras e simples’
Oscar Niemeyer



Lembrava-me de um comentário feito pelo presidente Chávez, quando da sua visita a minha residência, sobre um monumento a Bolívar, e, no dia seguinte, não sei por que, me surgiu a idéia de realizá-lo.

Sabia que um monumento a Bolívar tinha que ter plasticamente a grandeza dessa figura de revolucionário tão querida na Venezuela e nos demais países da América Latina. E a idéia que me ocorria de um extenso triângulo apontando para o exterior me entusiasmava. E o desenhei com 100 metros de altura e 170 metros de extensão.

Para alguns era uma forma um pouco agressiva; para mim justificava o momento político que vivemos na América Latina, com a Venezuela a liderar esse movimento de resistência às agressões de Bush. Mas a forma e as dimensões adotadas são tão puras e simples de realizar que acredito que nenhum problema especial possam oferecer.

O monumento projetado para Simón Bolívar reflete como eram indispensáveis a audácia e a coragem desse grande líder da América Latina.

Jornal O Globo, 31 de janeiro de 2007