14 maio 2007

O primeiro passo foi dado. Lamentável primeiro passo.

Seleção estética de embriões
Reino Unido autoriza clínica a eliminar portadores de falha genética que causa estrabismo


Londres. Pela primeira vez, um país deu autorização para a seleção de embriões por motivos estéticos. Uma clínica de reprodução assistida de Londres recebeu autorização da Autoridade Britânica de Fertilização e Embriologia para selecionar embriões sem uma falha genética associada ao estrabismo severo hereditário. A clínica London Bridge foi procurada por um casal fértil que deseja assegurar que não terá um filho vesgo.

O homem, um executivo de Londres cujo nome não foi divulgado, é profundamente estrábico, assim com o pai dele. Para evitar ter um filho com o mesmo problema — já que a condição é hereditária — ele optou pela reprodução assistida com seleção de embriões.

Hoje, embriões já são selecionados para a eliminação daqueles com defeitos genéticos associados a doenças graves, como fibrose cística. Porém, no caso do britânico, a principal motivação foi estética. O governo disse que o caso foi analisado por seu próprio mérito e que não se tornará a regra no país.

A seleção tem o nome técnico de diagnóstico pré-implantação e se baseia na retirada de uma célula de um embrião com cerca de três dias. Nesse estágio, um embrião tem oito células. Os embriões sem falhas genéticas são implantados no útero da mãe.

A autorização deflagrou uma onda de protestos de grupos de direitos humanos e de defesa da vida, para quem a prática é uma forma de eugenia e abre um precedente perigoso. No entanto, o diretor da clínica, Gedis Grudzinskas, disse que o estrabismo não é apenas um problema cosmético. De acordo com ele, neste caso em particular, o candidato a pai sofre de uma condição chamada fibrose congênita dos músculos extra-oculares.

— Em pessoas com este problema os músculos que controlam a orientação dos olhos são gravemente anormais, assim um olho pode estar voltado para a direção oposta do outro. Isso dificulta inclusive a comunicação, pois você nunca sabe para onde a pessoa está olhando — disse

O paciente de Grudzinskas já foi operado seis vezes, mas conseguiu apenas uma pequena melhora em seu problema. O médico disse que será cada vez maior o uso da seleção genética para eliminar problemas estéticos graves. E Grudzinskas não vê qualquer entrave ético na seleção estética. Ele disse ao jornal inglês “Daily Telegraph” que não hesitaria, por exemplo, em selecionar um embrião somente pela cor do cabelo, se este fosse o desejo dos pais e houvesse autorização do governo.

— Se um dos pais fosse asmático e pudéssemos detectar genes ligados à asma, eu também faria o procedimento. Tudo depende do grau de angústia familiar — afirmou ele ao jornal britânico.

O especialista em bioética David King, da ONG Human Genetics Alert, disse que a seleção só deveria ser usada para eliminar falhas de DNA que ameaçam a vida.

— Não é justo descartarmos embriões com a mesma expectativa de vida dos demais somente por motivos estéticos. Isso abre um caminho perigoso para todo tipo de violação ética — declarou King.


Publicado no jornal O Globo em 9 de maio de 2007.