11 dezembro 2007

Portinari




Prefeitura vai reformar a casa de Portinari


Imóvel, no Cosme Velho, está em péssimo estado, mas com verba de R$1 milhão deve virar um museu vivo

Paula Autran



Após cerca de cinco anos de esforços para recuperar e identificar a casa onde viveu o pintor Candido Portinari (1903-1962) — a de número 343 da Rua Cosme Velho —, seu filho, João Candido, viu a solução chegar quarta-feira, em pouco mais de uma hora de almoço com o prefeito Cesar Maia. Da mesa do restaurante, no Planetário, ele abriu seu laptop e digitou o decreto 28.800, publicado no dia seguinte no Diário Oficial: “A prefeitura assinará, imediatamente, convênio com a Associação Cultural Candido Portinari — Projeto Portinari, com vistas a reformar a casa onde viveu o pintor, futura Casa Ateliê Candido Portinari, que terá funções de ensino, cultura e visitação pública”.


Ainda segundo o decreto, a prefeitura investirá R$1 milhão na restauração da casa, em péssimo estado, e terá como contrapartida a capacitação de professores de artes da rede municipal de ensino. A associação fica com a responsabilidade de expor obras do pintor no local.


— Pensei que fosse brincadeira quando o vi redigindo o documento. Já tinha quase desistido, quando surgiu a chance desse encontro — diz João Candido, diretor do Projeto Portinari, fundado há 28 anos para preservar a memória do artista.


Cesar: ‘Resgate de Portinari era necessidade para o Rio’

Para o prefeito, a decisão de recuperar a casa em que Portinari viveu com a família, de 1943 a 1950, era uma necessidade.


— Tive a boa noticia de que a reforma da casa seria suficiente e que nossas professoras e alunos poderiam usá-la. Fiz o decreto imediatamente e disse a ele que os agradecimentos estavam invertidos: o Rio é que deveria agradecer — conta o prefeito, fazendo referência ao governo de Getúlio Vargas, que fechou a Universidade do Distrito Federal, onde lecionavam Portinari e Cecilia Meireles. — Vargas, na onda anticomunista, fechou a UDF. E os professores-intelectuais migraram para São Paulo. O “resgate” de Portinari era uma necessidade da cidade.


Não por acaso, nove anos depois da morte do pintor, o escritor Antonio Callado escreveu: “Quando já corriam sério risco de desaparecer, seus murais de Brodowski foram socorridos pelo governo de São Paulo, que transformou em museu do Estado a casa natal de Candido Portinari. O Rio ainda não prestou sua homenagem ao grande pintor, que aqui viveu a maior parte de sua vida, primeiro nos anos boêmios de antes da viagem à Europa e depois durante o resto de sua vida, na casa do Cosme Velho, e, finalmente, no apartamento do Leme”.

Na casa do Cosme Velho, Portinari viveu anos muito produtivos: foi lá que ele criou a série Retirantes, um dos pontos altos de sua obra, além de “Tiradentes”, um painel de 18 metros de largura por 3 metros de altura que nem cabia dentro da casa.


— Naquela época, ele construiu nos fundos um ateliê projetado por Oscar Niemeyer — relembra João Candido, que foi morar no imóvel aos 4 anos e brincou muito no amplo terreno, que sobe uma encosta.


Reforma deve demorar um ano para ficar pronta


O casarão já não pertencia à família Portinari há tempos quando, há cinco anos, o então proprietário procurou João Candido interessado em vendê-lo. A compra, por R$300 mil, só foi possível porque um casal de empresários, Dartagnan e Maria Zilda Guimarães, apaixonou-se pelo projeto de transformação do imóvel em um museu vivo e bancou o investimento. Luiz Fernando Dannemann, da Editora e Galeria Dom Quixote, também está colaborando: cedeu em comodato 40 obras originais de Portinari para exposição. Faltava a reforma, já que a casa sofre com cupins e infiltrações. Tanto que, há cerca de um mês, parte de uma varanda desmoronou. A obra deve demorar um ano.



Publicado no Jornal O Globo em 08 de dezembro de 2007